http://photos1.blogger.com/blogger/1866/2796/1600/alberto%20lapa.0.jpg
A minha foto
Nome:
Localização: Coimbra, Portugal

CARREGADOR DE PIANOS SERRA ACIMA E DEMAIS UTOPIAS DE SOPRO SERRA ABAIXO OU CALCETEIRO DE NUVENS ENQUANTO LUZ HOUVER E HOUVER PERNAS A ABRIR

quarta-feira, 16 de agosto de 2006

COM GUIA DE TRANSPORTE E ATESTADO DE GARANTIA

Cada dia que passe, é mais um dia vivido. E cada dia vivido, é menos um dia a viver, como se verá nas contas finais. Contas essas que nem chegarão a ser feitas por falta de tempo. Não é necessário um grande conhecimento de matemática para obter, sem estranheza, o resultado desta adição-subtracção contínua, continuada, continuável, enquanto por cá formos caminhando em direcção a nenhures. Porque há-de ser nenhures o que nos espera no fim da linha. E estando lá, seja lá onde for, não é por cá que estaremos, com toda a certeza.
Entretanto, por mero entretenimento, façamos de conta que estamos mortos, estendidos no esquife, vendo e ouvindo quem se for certificar de que morremos deveras, familiares, amigos, colegas, companheiros, vizinhos, gente que nunca imaginaríamos que de nós soubesse, gente acerca da qual nunca nos cuidámos em saber muito. E gente cujo fim principal é mostrar-se a quem esteja presente, além do morto. Gente que não presta, portanto, e ele anda aí tanta e de nós tão perto.
Este cheiro a cera é horripilante. E os crisântemos, condenados a tão macabro serviço, também não terão perfume que aspire a encómios, narizes abaixo ou acima. E muito pior que o pior pivete, é o cheiro da hipocrisia salmodiante, bendizente, curvilínea. Adaptável a qualquer ambiência onde lágrimas e cuspo se misturem em semelhante função de lubrificar emoções.
E é pena que, estando onde estamos, estando como estamos, deitados de costas e com as biqueiras dos sapatos tornadas ponto de mira, sem tremeluzir uma pestana, não possamos deslocar-nos até à secção das anedotas, na rua. Ou até à tasca mais próxima a beber um copo.
A morte, cá pela nossa banda, tem o seu quê de folclórico. Para quem fique, é claro. Para quem vá, tanto se lhe dá.